quinta-feira, 19 de junho de 2008

"Dizer a verdade, toda a verdade e só a verdade"



Até parece que estamos numa audiência no tribunal mas não, não é disso que se trata. Mas anda um pouco lá perto... Passo a explicar. É do conhecimento geral que a actividade dos advogados consiste em mostrar "o outro lado" da verdade, mostrar as evidências de uma outra perspectiva e, claro está, expor apenas o que convém. Ora bem, não querendo dizer com isto que o ideal é ser-se advogado do diabo, pretendo que siga o meu raciocínio.

Para dizer a verdade não precisa de mostrar o ângulo que menos favorece, precisa antes de uma descrição honesta e objectiva dos factos. No seu livro, Lois Frankel (LF) indica o exemplo de Anne Mulcahy, presidente e directora da Xerox que cometeu o grave erro de anunciar publicamente que a empresa possuía um modelo negocial insustentável. Como consequência directa as acções em bolsa cairam 26% no dia seguinte. Mais tarde, Anne Mulcahy reconheceu o erro e afirmou que poderia ter anunciado que a empresa reconhece a necessidade de introduzir alterações no seu modelo empresarial.

Ao longo do meu percurso profissional passei por algumas experiências menos agradáveis precisamente por considerar que a verdade não deve ser escondida. E continuo com esta máxima, simplesmente agora consigo perceber a diferença entre "isso é impossível de ser realizado" e "parece-me que o modelo de actuação não é o mais indicado, podemos revê-lo em conjunto". Isto é somente um exemplo daquilo que pode alterar no seu discurso enquanto profissional.

Quando lhe pedirem justificações, por exemplo, sobre determinado projecto que não foi entregue dentro do prazo não significa que tenha de assumir as culpas por inteiro. Para LF uma resposta honesta e apropriada seria: "Por duas ordens de razões essenciais. Primeiro, não tínhamos o pessoal necessário para cumprir um prazo que à partida não era realista; em segundo lugar a informação de que precisávamos para completar os dados que possuíamos só nos chegou dois dias antes do prazo expirar."

Evite pintar o cenário mais negro do que é na realidade, não se martirize quando as coisas correm mal e principalmente não se coloque numa situação defensiva (assim parece mesmo que a culpa é só sua). Aprenda a refutar os aspectos negativos com os positivos ou compare-os. Dar a volta à situação é também uma arte!

Dicas de LF:

Em vez de dizer:1 - Sou forçada a admitir que podia ter feito um trabalho melhor certificando-me de que não iriamos além do previsto no orçamento

2 - Julgo não ser a pessoa certa para o cargo, não possuo todas as qualificações que está a descrever

Diga:
1- Apesar de termos excedido o orçamento, concluímos o projecto antes do prazo

2- É certo que não preencho todos os requisitos para o cargo , mas a minha grande experiência confere-me o perfil adequado


2 comentários:

Anónimo disse...

Digamos que os eufemismos nunca fizeram mal a ninguém :) É aquilo que se diz: não é o QUE se diz, mas COMO se diz ihihhi

Quanto ao que referiste sobre os advogados, lembrei-me daquilo que estudei em semiótica e naquilo que me guia no dia-a-dia: cada pessoa tem a sua realidade; há tantas realidades quanto o número de pessoas.

Se os advogados só dizem aquilo que lhes convém, é porque são pagos para isso. Eles existem porque cada pessoa tem a sua perspectiva e tem de a defender, por mais estranha, inútil ou irreal que pareça aos demais :)

Marlene Conraria disse...

Espero não ter sido mal interpretada pois não foi minha intenção criticar os advogados. Respeito muito a profissão. Mas a comparação era inevitável.

Os advogados, para além de estarem a representar o cliente, também têm de acreditar no que estão a defender e só esses conseguem ter sucesso. Aliás, quando dizem o que mais convém é porque convém-lhes (mais um caso ganho) bem como aos seus clientes.

Concordo contigo quando dizes que "há tantas realidades quanto o número de pessoas". Apesar de vivermos todos no mesmo mundo, na mesma realidade...parece incongruente não?